terça-feira, 27 de março de 2007

Crónicas - Amareleja 17 Março




Amareleja

- campos pintados de amarelo pela mãe natureza.
- Flores amarelas que salpicam os campos na primavera.
- Brincadeira de miúdos lançando ovos contra as paredes da Igreja e gritando “já amareleja”.
Nós estivemos lá e comprovámos que tal como o campo branco repleto de magaças em Castro Verde, aqui o que nos rodeia e se estende pelos campos são flores amarelas.
Muito antes de avistarmos as casas caiadas de branco da Amareleja – porque não pintá-las de amarelo aproveitando as sinergias assim criadas à imagem do “slogan” ALL Garve, atravessámos o maior lago artificial da Europa, avistando a um lado Monsaraz e do outro Mourão. Bonito, sem dúvida, pena é que hoje toda esta água na planície secularmente sedenta pouco mais sirva do que para afogar os escassos alentejanos que por aqui ficaram – como diria aquele amigo contador de estórias vendo um conterrâneo observando tão extenso manto de água: - Então Manel o que contemplas com tanta atenção? E responde o Manel – Estou cá a ver quantos pães são precisos para fazer uma açorda com esta água toda.
Já quase a chegar ainda se vislumbram alguns olivais e muitas vinhas, que aqui é terra de maduros desde o tempo dos romanos e ainda hoje os caldos se apuram em vetustos potes de barro. Por fim lá fomos acompanhados por um “contrabandista” de bacalhau e bombazina – bens escassos nos idos anos sessenta. Caminhos limpos rodeados por terras pobres, em que uns quantos pinheiros mansos teimam em vingar. Alguns charcos para dar de beber ao gado, meia dúzia de eucaliptos e pastos a perder de vista ponteados por gado bovino que apascenta calmamente. De seguida a Herdade da Paz, bem conservada, poiso de algum latifundiário ausente. Lá fomos caminho das Mentiras, monte eminente que aqui nesta planura pode ter sido confundido com montanhas longínquas. Ao lado o velho posto da Guarda, meio restaurado, meio arruinado, que de aqui se avistam terras de Castela e de negócio.
Em tempos idos por aqui passavam alpercatas, “pyrex ‘s”, perfumes, caramelos, corpetes e saiotes, que a terra era pobre mas as gentes iguais a tantas outras de terras separadas por linhas aqui apenas imaginadas. Mas o verdadeiro negócio passava na época do nosso interlocutor pelo comércio do bacalhau para os restaurantes de Beja e nas fazendas aveludadas que lavradores e donzelas luziam em dias de festa. Mais gado mais montes esquecidos ou desleixados. Não muito longe um bando de grifos assustado sobe em círculo e afasta-se dos intrusos – para aí oitenta e tantos. Passada aquela linha imaginária, aqui cortada pelo arame farpado, entramos em terras de “Espanha”. Charas já floridas e imensas azinheiras, cruzadas por campos lavrados. Quintas ou “cortijos” como por aqui se chamam, bem mais humildes que as que deixámos do “outro lado”. Avistam-se já os quintais e logo as casas da vizinha povoação de Valência de Mombuey. Povoados tão diferentes com gentes tão iguais. Afinal as linhas traçadas sobre o papel moldaram a cultura das gentes e diferenciaram-nas por fora, pois que lá no fundo todos somos iguais, embora sendo diferentes.

domingo, 18 de março de 2007

Amareleja - 17.03.2007





E lá fomos saindo por esses campos fora num dia de verdadeira Primavera.
A passeata levar-nos-ia da Amareleja até Valência del Mombuey, já em terras de Espanha, recriando antigos percursos calcorreados pelos contrabandistas a coberto da noite pelo que a ADCMoura lhe deu o nome "Hasta españa, no rasto do contrabando".

Para mais fez-nos companhia o Sr. Francisco Vasques que nos contou algumas histórias na primeira pessoa ao longo dos 12 Km do percurso e nas paragens que fizémos. Histórias de fintas aos guardas civis e carabineiros, que agora nos soltam o riso, eram naqueles tempos histórias de sobrevivência, angústia e marginalidade. Chega a parecer irreal, especialmente aos mais novos, esta vivência com poucas décadas que envolvia contrabando de produtos como açúcar, arroz, sabão, farinha, pão, perfumes e café, restando o tabaco como único elemento a manter-se actual nesta história.

Um percurso que terminou num agradável jantar no Encalho, na Vila da Amareleja.

terça-feira, 13 de março de 2007

Fotografias em palavras 2 - Março 2007

Dia 11 de Março. Curvas e mais curvas, ainda ontem invisíveis no escuro silêncio das arribas do Douro a caminho de Freixo de Espada à Cinta, e agora descobrindo escarpas, e abrindo perspectivas apenas imaginadas, sobre os meandros do rio. As encostas plenas de intervenção humana - olivais e cada vez menos amendoeiras. Já próximo de Barca D' Alva desagua a ribeira do Mosteiro, que corre sinuosa entre escarpas e formações rochosas de quartzitos. Ao longo da ribeira, nas duas margens, meia dúzia de quintas, rodeadas de vistosos laranjais, nas cotas inferiores das ladeiras, depois oliveiras ancestrais, e coroando o terreno arável as floridas amendoeiras. Por aí nos perdemos intencionalmente, esmagados pelos picos abruptos sob o olhar atento dos grifos. Meio entontecidos com a beleza deslumbrante do local, repentinamente, surge-nos pela frente do outro lado do regato uma parede a pique, onde dissimuladamente se adivinhava aqui e ali algo que a natureza humana moldou por necessidade de transpor obstaculos, quem sabe se na fuga ao arbitrio do rio ou à ambição dos homens. Imponente, a calçada do ''diabo'' construída com recurso a grandes lajens de xisto, ziguezagueando para tentar vencer o desnível acentuado do terreno, lá nos transportou para a primeira plataforma. Afinal a Calçada de Alpajares que ainda resiste à fúria devastadora do abandono, nos seus cerca de oitocentos metros, não nos resistiu. Como que agradecida com inesperados visitantes presenteou-nos com paisagens únicas, onde convergiam imagens de escarpas, rios, grifos, laranjais, amendoeiras dispersas e o verde quase florido do rosmaninho, da giesta e da urze.
Sempre a subir, agora por campos inóspitos apenas cobertos de vegetação, lá vislumbrámos a povoação de Poiares, que através de uma ou outra amendoeira, já se deixava adivinhar. Oliveiras e campos de cultivo anunciam-nos o povoado eminente. As casas mais antigas e os palheiros levantados em xisto, pedra sobre pedra, teimam em manter-se de pé quase alheios ao desprezo dos homens. Poiares situa-se num extenso planalto fértil que teima em iludir os poucos que ainda por lá moram. Lá perto fica o Penedo Durão abrigo de "rapaces" que aí se julgam protegidas da curiosidade humana, mas que hoje disputam o seu território com homens alados que procuram matar o ócio citadino.

Fotografias em palavras

Não tenho fotos que documentem o que passei, nem palavras que expressem o que senti.
Desde Vilar de Amargos, onde visitámos uma capela do séc. XIII, outra do séc. XVII e a figura imponente do jornaleiro - obra recente mas muito curiosa esculpidada numa mole de granito. Até Barca d' Alva foram dezasseis km de sensações e sentidos. Os campos pejados de penhascos graníticos, alguns com formas estranhas, sulcados por cursos de água cristalina. A ribeira de Aguiar, apenas transponível por pontes ou pontões construídos com grandes lajens de granito. E logo de seguida algum vale fértil já manchado pelas margaças, e também os pombais , as quintas e tudo banhado por um sol luminoso e quente a anunciar os montes e tudo o mais que está lá por "Trás" - a chamada Terra Quente. Mais uma colina e, abruptamente, os granitos cedem o seu espaço ás terras xistosas que refrescam as cepas durienses, mas aqui ainda e apenas olivais plantados em socalcos, aparentando centenas de anos. Eis que aqui, ali, mais além manchas de floridas amendoeiras como que a dizer - a primavera já cá canta. Por fim os vinhedos e muitos sulcos sangrando estilhaços de xisto anunciando novas vinhas. Agora já se vêm os montes que comprimem o Douro e as suas águas espelhadas. À vista, num relance, Barca d' Alva. Da Barca que atravessava o rio já se não vislumbram vestígios mas da Alva todos demos notícia.

Amendoeiras em flor 2 - Março 2007




Percorreram a Ribeira de Mosteiro, que atravessaram sem hesitação, e depararam-se com a imponência da Calçada de Alpajares.
Olharam-na de alto a baixo, ou melhor, de baixo até ao alto uma vez que pretendiam subi-la.
Aquela calçada é obra!
Perceberam na sua presença a razão de também lhe chamarem Calçada do Diabo!
Sem perder o entusiasmo lançaram-se calçada acima num percurso de 800 metros com 28 curvas que ligam os diversos patamares limitados por fiadas de pedras.
Chegados ao topo gozaram por alguns momentos o prazer do feito, acompanhados por uma paisagem fantástica.
Era tempo de continuar até Poiares.

segunda-feira, 12 de março de 2007

Amendoeiras em flor 1 - Março 2007





Eram mais de 50 (outra vez) e (quase) anunciaram a sua partida de Vilar de Amargo na torre da igreja!
Fizeram-se ao caminho, "sempre por maus caminhos", percorrendo uns 16 Km até à Barca, Barca d' Alva.
Atravessaram rios, cruzaram olivais e admiraram pormenores das amendoeiras em flor num verdadeiro dia de Primavera.
Esperava-os ao fim da tarde um belo e merecido repasto com aquilo que o Douro nos dá.

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